A Quaresma é o resultado de um longo processo de sedimentação de três itinerários litúrgico-sacramentais: a preparação imediata dos catecúmenos para os sacramentos da Iniciação Cristã, a penitência pública e a participação da comunidade cristã nos dois anteriores como preparação para a Páscoa.

Em sua origem, a Quaresma tinha um caráter eminentemente catecumenal, correspondendo à última preparação dos catecúmenos. Mais tarde, passou a ter um caráter penitencial, já que diminuía o número de adultos que buscavam o Batismo, e a ênfase passou a ser a penitência, necessária aos pecadores. Com a reforma litúrgica, fruto do Concílio Vaticano II, a Quaresma passou a ter um duplo caráter – batismal e penitencial (cf. SC 109).

O tempo litúrgico da Quaresma coincide com o “grande retiro dos catecúmenos para que tenham acesso aos sacramentos pascais”. O objetivo deste tempo no itinerário da Iniciação Cristã – tempo da Iluminação ou da Purificação, conforme o Ritual da Iniciação Cristã de Adultos (RICA) – é “renovar a comunidade de fiéis, juntamente com os catecúmenos, tanto na Liturgia como na catequese litúrgica, por meio da recordação ou da preparação do Batismo e pela penitência” (cf. RICA. Observações Preliminares 21).

A preparação dos catecúmenos no tempo quaresmal visa mais o recolhimento espiritual e não a catequese propriamente dita, com o propósito de purificar corações e mentes, por meio do exame de consciência e da penitência, e sua iluminação mediante o aprofundamento nos ensinamentos de Jesus Cristo.

Na Liturgia da Palavra, nos cinco domingos quaresmais, vivenciamos:

– 1º e 2º domingos (anos A, B e C) constituem uma primeira mensagem cristã a partir das tentações de Cristo (tentações dos catecúmenos e dos já batizados no deserto da vida) e da sua transfiguração (glória participada no alto da montanha): somos chamados a refletir sobre a nossa vida cristã, como um vaivém entre tentações e superações, noites escuras e dias luminosos, jejum e refeições partilhadas, terra e céu, morte e vida.

– 3º, 4º e 5º domingos, especialmente no ano A, nos apresentam o evangelho segundo S. João com textos tipicamente catecumenais: Jesus promete a água viva à samaritana, conduz o cego de nascença à luz da fé e dá a vida a Lázaro (evangelhos batismais). No ano B os textos estão centrados na cruz e na ressurreição de Jesus (evangelhos pascais); no ano C, na misericórdia de Deus em relação à conversão (evangelhos penitenciais).

Deus chama não apenas alguns privilegiados à conversão, mas todos os homens. Se os catecúmenos se preparam para o Batismo, os batizados são chamados a reviver seus compromissos batismais e a pedir perdão por suas infidelidades diante da graça batismal recebida, participando do sacramento da reconciliação. Assim, a Quaresma renova a comunidade dos fiéis juntamente com os catecúmenos e os dispõe para celebrar o mistério pascal (cf. RICA 21).

Maria do Carmo Rollemberg