Confira a mensagem do Papa para o 53° Dia Mundial das Comunicações Sociais

« “Somos membros uns dos outros” (Ef 4, 25)
das comunidades de redes sociais à comunidade humana»

*53° Dia Mundial das Comunicações Sociais
(2 de junho de 2019)

Queridos irmãos e irmãs!
Desde quando se tornou possível dispor da internet, a Igreja tem sempre procurado que o seu uso sirva o encontro das pessoas e a solidariedade entre todos.
Gostaria de vos convidar uma vez mais a refletir sobre o fundamento e a importância do nosso ser-em-relação e descobrir, nos vastos desafios do atual panorama comunicativo, o desejo que o homem tem de não ficar encerrado na própria solidão.

As metáforas da «rede» e da «comunidade»

Hoje, o ambiente dos mass-media é tão invasivo que já não se consegue separar do círculo da vida quotidiana. A rede é um recurso do nosso tempo: uma fonte de
conhecimentos e relações outrora impensáveis. Mas numerosos especialistas, a propósito das profundas transformações impressas pela tecnologia às lógicas da
produção, circulação e fruição dos conteúdos, destacam também os riscos que ameaçam a busca e a partilha duma informação autêntica à escala global. Se é verdade que a internet constitui uma possibilidade extraordinária de acesso ao saber, verdade é também que se revelou como um dos locais mais expostos à desinformação e à distorção consciente e pilotada dos fatos e relações e à distorção consciente e pilotada dos fatos e relações descrédito.

É necessário reconhecer que se, por um lado, as redes sociais servem para nos conectarmos melhor, fazendo-nos encontrar e ajudar uns aos outros, por outro, prestam-se também a um uso manipulador dos dados pessoais, visando obter vantagens no plano político ou econômico, sem o devido respeito pela pessoa e seus direitos. As
estatísticas relativas aos mais jovens revelam que um em cada quatro adolescentes está envolvido em episódios de cyberbullying.

Na complexidade deste cenário, pode ser útil voltar a refletir sobre a metáfora da rede, colocada inicialmente como fundamento da internet para ajudar a descobrir as
suas potencialidades positivas. A figura da rede convida-nos a refletir sobre a multiplicidade de percursos e nós que, na falta de um centro, uma estrutura de tipo
hierárquico, uma organização de tipo vertical, asseguram a sua consistência. A rede funciona graças à comparticipação de todos os elementos.

Reconduzida à dimensão antropológica, a metáfora da rede lembra outra figura densa de significados: a
comunidade. Uma comunidade é tanto mais forte quando mais for coesa e solidária, animada por sentimentos de confiança e empenhada em objetivos compartilháveis. Como rede solidária, a comunidade requer a escuta recíproca e o diálogo, baseado no uso responsável da
No cenário atual, salta aos olhos de todos como a comunidade de redes sociais não seja, automaticamente, sinônimo de comunidade. No melhor dos casos, tais
comunidades conseguem dar provas de coesão e solidariedade, mas frequentemente permanecem agregados apenas indivíduos que se reconhecem em torno de interesses ou argumentos caraterizados por
vínculos frágeis.

A rede é uma oportunidade para promover o encontro com os outros, mas pode também agravar o nosso auto-isolamento, como uma teia de aranha capaz de capturar.
Os adolescentes é que estão mais expostos à ilusão de que a social web possa satisfazê-los completamente a nível relacional, até se chegar ao perigoso fenômeno dos jovens «eremitas sociais», que correm o risco de se alhear totalmente da sociedade. Esta dinâmica dramática manifesta uma grave ruptura no tecido relacional da sociedade, uma laceração que não podemos ignorar.
Naturalmente não basta multiplicar as conexões, para ver crescer também a compreensão recíproca. Então, como reencontrar a verdadeira identidade comunitária
na consciência da responsabilidade que temos uns para com os outros inclusive na rede on-line?

«Somos membros uns dos outros»

Pode-se esboçar uma resposta a partir duma terceira metáfora – o corpo e os membros – usada por São Paulo para falar da relação de reciprocidade entre as pessoas,
fundada num organismo que as une. «Por isso, despi-vos da mentira e diga cada um a verdade ao seu próximo, pois somos membros uns dos outros» (Ef 4, 25). O fato de
sermos membros uns dos outros é a motivação profunda a que recorre o Apóstolo para exortar a despir-se da mentira e dizer a verdade: a obrigação de preservar a verdade
nasce da exigência de não negar a mútua relação de comunhão. Com efeito, a verdade revela-se na comunhão; ao contrário, a mentira é recusa egoísta de reconhecer a própria pertença ao corpo; é recusa de se dar aos outros, perdendo assim o único caminho para se reencontrar a si mesmo.

A metáfora do corpo e dos membros leva-nos a refletir sobre a nossa identidade, que se funda sobre a comunhão e a alteridade. Como cristãos, todos nós reconhecemos
como membros do único corpo cuja cabeça é Cristo. Isto ajuda-nos a não ver as pessoas como potenciais concorrentes, considerando os próprios inimigos como pessoas. Já não tenho necessidade do adversário para me autodefinir, porque o olhar de inclusão, que
aprendemos de Cristo, faz-nos descobrir a alteridade de modo novo, ou seja, como parte integrante e condição da relação e da proximidade.
Uma tal capacidade de compreensão e comunicação entre as pessoas humanas tem o seu fundamento na comunhão de amor entre as Pessoas divinas. Deus não é
Solidão, mas Comunhão; é Amor e, consequentemente, comunicação, porque o amor sempre comunica; antes, comunica-se a si mesmo para encontrar o outro. Para
comunicar conosco e Se comunicar a nós, Deus adapta-Se à nossa linguagem, estabelecendo na história um verdadeiro e próprio diálogo com a humanidade (cf. Conc.
Ecum. Vat. II, Const. dogm. Dei Verbum, 2).
Em virtude de termos sido criados à imagem e semelhança de Deus, que é comunhão e comunicação-de-Si, trazemos sempre no coração a nostalgia de viver em comunhão, de pertencer a uma comunidade.
O panorama atual convida-nos a investir nas relações, a afirmar – também na rede e através da rede – o caráter interpessoal da nossa humanidade. Por maior força
de razão nós, cristãos, somos chamados a manifestar aquela comunhão que marca a nossa identidade de crentes. A própria fé é uma relação, um encontro; e nós, sob o impulso do amor de Deus, podemos comunicar, acolher e compreender o dom do outro e corresponder-lhe.
É precisamente a comunhão à imagem da Trindade que distingue a pessoa do indivíduo. Da fé num Deus que é Trindade, segue-se que, para ser eu mesmo, preciso
do outro. Só sou verdadeiramente humano, verdadeiramente pessoal, se me relacionar com os outros. Com efeito, o termo pessoa conota o ser humano como «rosto», voltado para o outro, comprometido com os outros.

Do «like» ao «amém»

A imagem do corpo e dos membros recorda-nos que o uso da social web é complementar do encontro em carne e osso, vivido através do corpo, do coração, dos
olhos, da contemplação, da respiração do outro. Se a rede for usada como prolongamento ou expectação de tal encontro, então não se atraiçoa a si mesma e
permanece um recurso para a comunhão. Se uma família utiliza a rede para estar mais conectada, para depois se encontrar à mesa e olhar-se olhos nos olhos, então é um
recurso. Se uma comunidade eclesial coordena a sua atividade através da rede, para depois celebrar juntos a Eucaristia, então é um recurso. Se a rede é uma oportunidade para me aproximar de casos e experiências de bondade ou de sofrimento distantes fisicamente de mim, para rezar juntos e, juntos, buscar o bem na descoberta daquilo que nos une, então é um recurso.

Assim, podemos passar do diagnóstico à terapia: abrir o caminho ao diálogo, ao encontro, ao sorriso, ao carinho. Esta é a rede que queremos: uma rede feita, não para
capturar, mas para libertar, para preservar uma comunhão de pessoas livres. A própria Igreja é uma rede tecida pela Comunhão Eucarística, onde a união não se baseia nos
gostos [«like»], mas na verdade, no «amém» com que cada um adere ao Corpo de Cristo, acolhendo os outros.

Franciscus
Libreria Editrice Vaticana