A Palavra de Deus na liturgia de domingo passado (31 de julho) nos convidava a refletir sobre dois temas chaves relacionados com nosso peregrinar como cristãos neste mundo: a fugacidade da vida em todas as suas dimensões e o valor que nela damos aos bens materiais.

O livro do Eclesiastes ou “Coélet”, com seu realismo vivo, cru, aparentemente “ ácido”, insistia em forma de refrão que todas as coisas são “ vaidade”. O sentido da expressão hebraica subjacente à “vaidade” na verdade é simplesmente o de “vapor, sopro”, algo que se esvai (sem conotação moral ou negativa). Bom observador da realidade, o autor do Eclesiastes, emerge como uma pessoa de fé (seu escrito faz 40 vezes referência a “Deus”, como benfeitor e criador mas também juiz) mas que tem os pés bem firmes no chão. Na sua sábia reflexão crente, Coélet se da conta e recalca que todas as realidades de nossa experiência são como “sopro” que passa ou “vapor” que se dissolve. Tudo passa e nós passamos também.

Dentre as varias dimensões do humano sobre as quais reflete, o trecho do Eclesiastes nos chamava a atenção para o inconsistente que é o viver para acumular bens materiais. Dessa vida ninguém leva nada consigo, exceto a vida que leva. Ao tempo do Coélet ainda não se postulava na fé judaica a existência de uma vida após a morte. Ainda assim, diante da sua crua constatação do fugaz de tudo, nosso autor insiste na importância de viver no “temor de Deus” (entendido como “relação reverencial”) e com alegria, que podemos encontrar mesmo nas coisas que passam.

Essa interessante linha de reflexão do Antigo Testamento, Jesus coroa com a historieta do homem rico e acomodado, representante daquela classe de pessoas que vivem para acumular bens materiais. Jesus nos convida a tornar-nos ricos de Deus, através de uma vida regrada pelo único que não passa. Recorda-nos, que assim como o início, também o fim de nossa existência não está em nossas mãos. Os bens que legitimamente usufruímos deveriam nos ajudar a peregrinar. Partilha e desprendimento são palavras de ordem neste sentido. Afinal, a porta estreita da vida eterna a gente só consegue cruzar desprovidos de sacolas.

Pe. Lucas Teixeira