No Magistério do Papa Bento XVI e  em seu livro sobre a infância de Jesus encontramos reflexões extraordinárias sobre os magos do Oriente que foram adorar o Senhor recém-nascido. Esses personagens foram verdadeiros peregrinos na fé e podem ser luzes para o nosso caminho. As reflexões do Papa sobre os magos são muito ricas e aqui queremos nos centrar num ponto: eles eram verdadeiros homens de diálogo e por esse meio chegaram a conhecer e a anunciar Jesus Cristo.

Certamente, em primeiro lugar nos vêm à mente o diálogo deles com os líderes de Israel em Jerusalém, quando a estrela que os guiava momentaneamente se ocultou. Imaginemos a grande surpresa que tiveram ao saber que no palácio real não havia ninguém que estivesse para dar à luz. Então os sacerdotes e escribas, conhecedores das Sagradas Escrituras, disseram-lhes que o rei dos judeus deveria nascer na desconhecida Belém, a “cidade do pão”. Aqueles homens buscaram o rei dos judeus no lugar justo e, não o encontrado, deixaram-se conduzir pelo diálogo com os sábios. E isso lhes levaria ao encontro de Cristo.

Mas mesmo antes dessa cena o diálogo era o que guiava a vida daqueles homens. A Bíblia nos diz que eles eram homens de fé e também de ciência. Provavelmente eram astrônomos orientais, que observavam as estrelas procurando ler nelas os sinais de Deus. Utilizavam a própria razão na busca do Criador. Na alma deles essas duas capacidades humanas, fé e razão, estavam sempre em diálogo, em busca de uma perfeita harmonia.

O Papa Bento XVI no seu livro diz que esses eram homens que tinham uma grande inquietação interior que os levou a sair de si mesmos. Eles eram o que na Antiguidade se chamava “filósofos”, ou seja, pessoas que buscavam a verdadeira sabedoria por todos os caminhos possíveis: a obra da criação, o saber científico, a filosofia, as religiões. O que o coração deles realmente desejava era a sabedoria: explicar o porquê do mundo e encontrar um sentido para a própria vida. E, buscando a sabedoria, eles seguiam o caminho aberto por Sócrates que, através do diálogo, procurava responder a pergunta sobre o que é o homem, indo além das religiões oficiais.

Os reis magos seguiram a estrada de Sócrates, ou seja, utilizaram a própria razão para procurar as respostas fundamentais sobre o mundo e a vida por meio do dialógo. A razão humana (logos) é, de fato, uma potência para o encontro com os outros, algo que une o que estava separado: dia-logos.

Num discurso à Universidade Sapienza de Roma em 2008, o Papa disse que a pergunta socrática sobre o homem foi o impulso que deu origem à Universidade ocidental, na qual se buscava harmonizar fé e a razão. De fato, é extraordinário pensar que o método de ensino naquelas instituições era o mesmo método socrático: o diálogo. Esses eram posteriormente transcritos, em forma de questões (quaestio), dando origem às chamadasSumas e Questões disputadas. Naqueles textos, que hoje podem parecer frios, estava condensado o ideal socrático: descobrir a verdade sobre Deus, sobre o mundo e sobre o homem, por meio do diálogo. E participavam do diálogo não só os ensinamentos bíblicos, dos Padres da Igreja e doutores eclesiásticos, mas também os filósofos gregos, judeus e muçulmanos. Todos participavam no diálogo cultural com o único objetivo de conhecer e dar a conhecer a verdade.

Atualmente há quem diga que o monoteísmo é uma ameaça à paz mundial, porque a pretensão de haver uma verdade absoluta levaria à intolerância para com quem não professa a mesma fé e destruiria a possibilidade do diálogo, o que evidentemente é um absurdo, também desde o ponto de vista histórico.

Certa vez o Papa lembrou-nos uma afirmação de São Tiago: «Sois gerados por meio de uma palavra de verdade» (1,18). E dizia que hoje a ideia de verdade e de intolerância estão quase completamente fundidas entre si, de modo que não ousamos mais crer ou falar da verdade. Essa deve parecer sempre como algo distante, a qual é melhor não recorrer. Por isso, ninguém poderia dizer: «tenho a verdade». E o Papa dizia que é justo que ninguém pode dizer que tem a verdade, porque a verdade é algo vivo, é uma pessoa, e é ela que nos possui. Não somos os seus detentores, mas seus servidores, na medida em que somos atraídos por ela. Assim como devemos aprender a esse «não-ter-a-verdade», os pais devem aprender a não dizer: «tenho filhos»; pois os filhos não são uma posse, mas um dom, uma dádiva de Deus e uma tarefa.

Os magos buscaram a verdade, seguindo o caminho do diálogo, que era o mesmo de Sócrates e também de Abraão, que, ao ser interpelado por Deus, saiu de sua pátria, de si mesmo, o que implica sacrifícios. Para os magos, a peregrinação exterior terminou no encontro com o Rei dos judeus que nasceu como uma pobre criança e aí iniciava uma nova peregrinação para eles: aquela Revelação da verdade de Deus era uma luz nova que lhes abria horizontes novos de existência e que devia ser comunicada.

Portanto, pode-se conhecer a verdade sobre Deus, sobre a fé, sem que essa verdade seja total, mas uma luz nova que guia a nossa vida e que vai aos poucos iluminando nossa existência. Conhecer a verdade não significa possuí-la totalmente e muito menos querer impô-la. Mas é o início de uma nova estrada que nos ilumina e pode iluminar, por meio do diálogo, a quem tem o coração inquieto. «O novo Rei, diante do qual se tinham prostrado em adoração, diferenciava-se muito da expectativa deles. Começou assim o seu caminho interior. Começou no mesmo momento em que se prostraram diante deste menino e o reconheceram como o Rei prometido. Mas eles ainda tinham que alcançar interiormente estes gestos jubilosos. Deviam mudar a ideia que tinham acerca do poder, de Deus e do homem e, fazendo isto, deviam também eles mesmos mudar».

Trecho do artigo de * Pe. Anderson Alves, sacerdote da diocese de Petrópolis – Brasil. Doutorando em Filosofia na Pontificia Università della Santa Croce em Roma.

Fonte: zenit.org